Uma vitória do direito, mais do que da vida

O julgamento virtual pelo Plenário do Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5581, que pedia o aborto em caso de a gestante ter zica, foi acompanhado de perto pelos movimentos pró-vida, e o resultado bastante comemorado por nós. Não cabe, entretanto, falar em uma “vitória da vida”, porque o mérito da ação não foi julgado. Cabe, sim, comemorar a vitória do direito, que evitou que o STF se pronunciasse em uma ação que era puro malabarismo jurídico, para levar ao Supremo Tribunal Federal assunto que cabe ao Congresso Nacional.

Por unanimidade – com ressalvas do Ministro Barroso -, o plenário, em sessão virtual concluída no dia 30/04, julgou prejudicada a ADI 5581, ajuizada pela Associação Nacional dos Defensores Públicos (Anadep). A ação foi movida contra dispositivos da Lei 13.301/2016, que trata de medidas de vigilância em saúde relativas aos vírus da dengue, da chikungunya e da zika, e pedia alterações nesses dispositivos. Ora, o âmbito adequado para se modificar uma lei é o Congresso Nacional, e foi exatamente isso que ocorreu, partindo da Medida Provisória 894/2019, que institui pensão vitalícia a crianças com microcefalia decorrente do zika vírus, que após amplo debate e apresentação de substitutivos, foi aprovada como Lei 13.985/2020. Coerentemente, a relatora, ministra Cármen Lúcia, votou pela perda do objeto da ação, diante da revogação do principal ponto questionado pela ADI 5581.

Podemos perguntar-nos: por que a Anadep levou ao STF um tema que poderia facilmente ser solucionado pelo Congresso Nacional, como efetivamente foi? Por que questionar a constitucionalidade de uma lei que não entra em temas constitucionais? Ficou evidente que essa parte da demanda era apenas uma “cortina de fumaça” para tratar do tema que realmente importava: a legalização do aborto, e um aborto eugênico, pela possibilidade de a criança nascer com deficiência.

Juntamente com a ADI foi ajuizada ação de arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF). A entidade pedia a declaração de inconstitucionalidade do enquadramento da interrupção da gestação em relação à mulher infectada pelo zika vírus no artigo 124 do Código Penal. Novamente, a busca de que o STF entre no âmbito do Legislativo. Acompanhando a relatora, o plenário do STF concluiu que a Anadep não tem legitimidade para a propositura da ADPF. Segundo relato do próprio site do STF, “a ministra ressaltou que a jurisprudência do STF somente reconhece a legitimidade das entidades de classe nacionais para o ajuizamento de ação de controle abstrato se houver nexo de afinidade entre os seus objetivos institucionais e o conteúdo dos textos normativos. No caso, ela não constatou interesse jurídico da associação de procuradores nas normas e políticas públicas questionadas”.

Aguarda julgamento no STF outra ADPF, a 442, que pede a legalização do aborto até 12 semanas de gravidez. Novamente, “malabarismo jurídico”, realizado pelo partido político PSOL. Esperamos do STF um posicionamento similar ao ocorrido na ADI 5581, negando-se a participar de “drible” ao Congresso Nacional. Deputados do PSOL já propuseram projeto de lei no mesmo teor, que se encontra em debate no Parlamento. Defendam ali a sua visão, da qual discordamos radicalmente, mas que respeitamos no debate democrático, para o qual o povo elege os seus representantes.

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